Cruz Vermelha usou dinheiro do Trauma para pagamento de dívidas

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A inspeção do Tribunal de Contas do Estado (TCE) no contrato de terceirização do Hospital de Emergência e Trauma de João Pessoa revelou que a Cruz Vermelha do Rio Grande do Sul, contratada para administrar o hospital, teria utilizado R$ 244.990,00, sacados em conta bancária do Trauma, para pagar dívida trabalhista da Organização Social.

Essa é mais uma das irregularidades levantadas pela auditoria do TCE, no ano passado, além do desvio de R$ 4 milhões em compras não comprovadas de medicamentos e pagamento de supersalários, que foram noticiados pelo Jornal da Paraíba nos últimos dias 23 e 27.

O relatório da auditoria faz parte do processo 02642/14, referente a Inspeção Especial de Contas relativa ao exercício 2013 da Secretaria de Estado da Saúde (SES).

Os auditores descobriram que da verba destinada à manutenção e funcionamento dos serviços hospitalares no Trauma, a Cruz Vermelha teria desviado em 13 de março de 2013 cerca de R$ 300 mil para resolver bloqueio da conta bancária da Cruz Vermelha Brasileira. O dinheiro foi retido por ordem da Justiça do Trabalho, para garantir o pagamento dos direitos trabalhistas de Giordana Lícia Wrublesk da Rocha. A autora de ação nada tem ou teve a ver com o Trauma de João Pessoa.

A gravidade do caso ficaria ainda mais evidente quando se sabe que a Justiça do Trabalho, ao determinar o bloqueio judicial de determinado valor, indica o CNPJ da organização, independente de matriz ou filiais, mas os R$ 300 mil foram descontados de contas bancárias do hospital paraibano.

O relatório de auditoria sobre a operação destaca, também, que do total sacado das contas do Hospital de Trauma para pagar a dívida trabalhista da Cruz Vermelha, a filial gaúcha devolveu apenas R$ 55.010,00 nos meses de agosto e dezembro de 2013. Por conta disso, os técnicos recomendam a imediata devolução ao erário estadual do valor de R$ 244.990, sob pena de responsabilização pessoal e solidária dos gestores envolvidos.
“Tal valor pertence legitimamente ao hospital, sendo inaceitável que os recursos públicos estaduais financiem encargos financeiros, de qualquer natureza, da Cruz Vermelha Brasileira, seja qual for sua filial”, enfatizam os auditores do TCE no relatório de inspeção.

IDENTIFICADO PAGAMENTO DE ENCARGOS

Outro bloqueio judicial constatado pela auditoria do TCE afetou a empresa Ágape Construções e Serviços Ltda., que prestava serviços de limpeza e conservação no hospital e teve o contrato rescindido em agosto do ano passado, por falta de pagamento aos seus empregados e de quitação de tributos previdenciários.

A administração do hospital notificou a empresa e o Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas Prestadoras de Serviços Gerais da Paraíba (Sinteg) e ingressou com ação na Justiça do Trabalho para sanar o problema. Neste caso, foi retido judicialmente o valor de R$ 152.972,96, mas sem prejuízo para o Hospital de Trauma, pois se tratava de pagamento mensal devido. A retenção foi realizada para garantir o pagamento dos salários dos empregados.

A auditoria do TCE identificou outras irregularidades no pagamento de encargos trabalhistas. O Trauma efetivou diversos pagamentos de serviços, bem como desembolsos com PIS sobre folha, com incidência de multas e juros no valor total de R$ 39.078,94 em 2013. “Tal fato caracteriza má utilização dos recursos públicos, uma vez que tais recursos foram carreados para um ‘ralo’, sem conversão em serviços ou benefícios para a sociedade”, aponta o relatório.

O procedimento administrativo efetuado pelo Hospital de Trauma, no entender da auditoria, afronta conjuntamente os princípios da eficiência e economicidade no setor público. Para completar, a irregularidade é recorrente, pois já teria sido cometida em 2012. Os auditores consideraram o ato passível de imputação de débito ao gestor responsável e solicitam a devolução dos R$ 39 mil aos cofres estaduais, inclusive com entendimento já pacífico do TCE quando da análise de contas municipais em relação a casos semelhantes.

AÇÃO AJUIZADA EM SANTA CATARINA 

Atendendo a pedido de informações e esclarecimentos enviado pela Reportagem, a Assessoria de Comunicação do Trauma enviou nota na qual não desmente o fato denunciado no relatório de auditoria do TCE e revela que a dívida trabalhista paga pela Cruz Vermelha com recursos do hospital decorre de ação ajuizada em Balneário Camboriú (SC).

“A direção da Cruz Vermelha e do Hospital de Emergência e Trauma Senador Humberto Lucena, vem, mais uma vez, esclarecer que esta trata-se de mais uma excrescência produzida sob os auspícios do jogo político mal intencionado. O bloqueio em referência é, na verdade, uma decisão proferida nos autos da Ação Cautelar que tramita na 2ª Vara de Trabalho de Balneário de Camboriú. O ato proferido pelo Exmo. Juiz determinou o bloqueio por intermédio do convênio BACENJUD de ativos financeiros de titularidade da Cruz Vermelha Brasileira Filial do Rio Grande do Sul mantidos em instituições bancárias até o montante de R$ 300.000,00, o qual foi feito na conta destinada à administração do Hospital de Trauma”, diz a nota.

Diz ainda: “O recurso a esta decisão foi prontamente apresentado e espera julgamento do mérito. Portanto, esta instituição não está inerte e tem cumprido o seu papel de zelar pelo patrimônio público do Estado da Paraíba, com a mesma presteza e qualidade com que trata o povo nas dependências do Hospital de Trauma”.

A organização e a direção do Trauma encerram a nota afirmando que “nos valeremos de todos os meios recursais existentes para alcançar a devolução do que fora bloqueado erroneamente pela Justiça na conta destinada à gestão do Hospital de Trauma”. Jornal da Paraíba